Friday, July 31, 2009

You Are (Not) Alone - Part II

A noite caía enquanto Clarice viajava em suas idéias revolucionariamente domésticas. Ela tinha agora que decidir não só o seu futuro, mas o do filho também. Tanta coisa passava por sua cabeça... Ela não gostava nem um pouco de ficar confusa, era uma mulher muito prática e decidida, mas aquela carta estava traçando um novo caminho em sua vida. Tantas perguntas lhe surgiam, e poucas respostas, escassas soluções, atitudes radicais.
Decidiu escutar seu coração que batia descompassado por duas razões distintas: a traição de Vito, completamente inesperada, e aquela tarde consolada por Miguel.
Como alguém poderia ter vindo do nada e despertar um sentimento louco, repentino e doce como aquele em tão pouco tempo ?
- Vito nunca me fez sentir assim... sempre senti muita calma com ele... O que está havendo comigo, Deus ? Por que ele não sai da minha cabeça ?
Clarice andava em seu quarto, de um lado para o outro, com a mão na cintura e a outra em seus cabelos. O que fazer ? Procurar Miguel e se certificar de que aquele novo e indefinido sentimento era genuíno ? Ligar para Vito e terminar seu casamento ali, numa ligação fria e interurbana ? Fugir com filho sem deixar rastros ?
Ela pegou o filho no quarto, foi descendo as escadas com ele em seus braços e foi para a sala de estar. Ali, ficou olhando para ele e imaginando o que iria acontecer.
- Vitinho... será que vamos ser felizes ?, ela perguntava ao menino. Ele apenas a olhava curioso enquanto se mexia, brincando com seu mordedor.
Clarice resolveu ir se deitar e relaxar. Subiu novamente as escadas, colocou o filho no berço e foi para seu quarto. Foi tirando sua roupa enquanto pegava sua camisola de seda no armário. A colocou, foi ao banheiro e olhou-se no espelho. Viu seus verdes olhos repletos de dúvida e angústia, mas naquele momento teve um rompante de loucura. Seu coração parecia querer sair do peito, e ela decidiu seguí-lo até o fim.
Passou mais um pouco de seu doce perfume e foi andando, descalça, em direção à cozinha. Chegou até a porta que dava para os fundos da casa e hesitou por um momento. Respirou fundo e andou mais alguns passos. Levantou a mão em um punho cerrado e deu três batidas na porta do quarto de Miguel. Ficou com os olhos fechados, imaginando que ele já estivesse dormindo, mas a porta abriu-se rapidamente, assim como seus olhos, que novamente fitaram os do mordomo.
- Você.. achei que estivesse dormindo..., disse ela com uma suave e melodiosa voz.
- Não... eu não consegui.
- Hm.. é.. você.. não precisava ter pedido desculpas...- disse Clarice, pegando a mão de Miguel e colocando em seu peito - Sente ? Foi a mesma coisa que senti quando você fez isso com a minha mão.
Miguel sorriu e pegou as mãos de Clarice. Os dois estavam parados, se olhando. Foi quando num ímpeto só, ele a puxou e lhe deu um profundo beijo. Ela então o abraçou forte e retribuiu o gesto. Ele fechou a porta do quarto e ali, ela compatilhou do amor mais puro e do corpo mais quente que já havia ficado sobre o seu. Os beijos eram apaixonados, no ritmo certo de ambos os corpos, que certificando e validando o início de uma história, se uniam na luxúria romântica de um novo amor.
Aquilo se repetiu por boa parte da noite, até que os dois exaustos, dormiram juntos, um de frente para o outro.
A manhã chegou ensolarada e trazendo consigo o choro do pequeno Vito. Clarice sorriu enquanto acordava, mas sem abrir os olhos. Quando os fez, viu Miguel, acariciou seu rosto, seus cabelos, deu -lhe um beijo e foi se levantando. Saiu da cama nua, foi até a cadeira onde estava sua camisola e colocou-a, deixando que ela deslizasse sobre sua pele. Miguel a viu de pé e se levantou também. A abraçou por trás e num gesto terno, afastou os cabelos dela da nuca e deu um beijo.
- Bom dia...
- Bom dia..., disse Clarice sorrindo enquanto suspirava - Preciso ir ver o bebê, acho que ele já acordou.
- Tudo bem. Eu vou até a cozinha ver se o café está pronto.
- Ok.
E Clarice deu-lhe outro beijo, tão devotado como todos os outros desde o primeiro.
Ela saiu do quarto dele, entrou na casa e foi correndo até o quarto de Vito onde ele chorava. O coração dela só não parou naquele momento pois precisou agir com rapidez.
Ela viu o bebê do lado de fora do berço, no chão, gritando o mais alto que seus pulmões conseguiam, com um corte na cabeça e o rosto ensanguentado.
- VITO ! - Clarice gritou - Meu Deus ! O que houve com você, meu filho ?!
Ela então pegou-o no colo e gritou pela governanta, que veio de pronto ao quarto.
- Sim, senhora ?
- Grazia, limpe ele enquanto eu troco de roupa e chamo Miguel para irmos ao hospital, sim ?!
- Claro, senhora, claro.
E a governanta foi correndo até o banheiro onde limpou, com todo o cuidado o bebê que ainda chorava a plenos pulmões.
Clarice se aprontou em pouco tempo e foi então chamar Miguel. Desceu as escadas correndo, com o salto de seu sapato fazendo barulho. Abriu a porta do quarto de Miguel e, esbaforida disse:
- Miguel, rápido ! Temos que levar Vito ao hospital !
Ele estava com uma camisa branca bem engomada, com manga comprida e botões de madrepérola. Ele trocou a calça e pegou uma, junto a um paletó preto, com risca de giz. Pegou seu chapéu, também preto, e um grande casaco branco. Acompanhou Clarice na corrida até o bebê, não deixou que ela o pegasse nos braços e foi levando-o até o carro, acompanhado por ela logo atrás.
Eles entraram no carro e ele deu Vito para Clarice segurar. Saiu cantando os pneus e chegou ao hospital em menos de 10 minutos. Saiu do carro, abriu a porta para ela e foi acompanhando-a.
Chegando ao balcão do hospital, Clarice disse:
- Por favor, precisamos de um médico rápido ! Meu filho caiu do berço e se machucou, pelo amor de Deus, me arrume um médico !
A enfermeira vendo o bebê inquieto, foi correndo chamar alguém para atendê-los, enquanto outra veio e disse com desânimo e desdém:
- A senhora precisa fazer a ficha dele aqui.
Clarice lançou um olhar furioso à enfermeira, e antes que ela pudesse ter pronunciado qualquer palavra de baixo calão, Miguel tomou as rédeas da situação e sério disse:
- A ficha será feita depois que ele foi atendido.
- Acho que o senhor não entendeu... - e a enfermeira olhou com desprezo - ela vai ser feita agora.
Miguel a olhou fundo nos olhos, com os seus ardendo em ódio profundo, levantando a voz em um tom austero:
- A senhora é que não entendeu... ele é meu filho e vai ser atendido agora ! Dane-se essa ficha maldita ! Ela vai ser preenchida DEPOIS !
A enfermeira não sabia onde enfiar-se. Balbuciou qualquer coisa e saiu do balcão. Clarice não conseguia nem piscar, ficou estupefata com o que acabara de ver. Naquele momento de admiração, orgulho e desespero, o médico veio correndo.
- Me desculpem ! Acabei de sair de uma cirurgia... vamos indo à sala, por favor - disse ele apontando com a mão e andando até lá.
Clarice continuava a limpar o rosto de seu filho, que se manchava de sangue pelo corte aberto em sua pequena e delicada testa. Miguel olhava o bebê como se realmente fosse pai dele, afinal... desde o nascimento de Vito, seu pai não mais ficava em casa, mas sim tratando dos negócios da família. Logo, Miguel era quem ficava com o bebê e com Clarice.
Os três entraram na sala e o médico tomou Vito dos braços da mãe. O colocou na maca e foi limpando o bebê com gaze e álcool para esterilizar o ferimento. A enfermeira que os havia atendido na chegada veio correndo com os instrumentos necessários. Ficou ao lado do médico, auxiliando-o. Ele deu três pontos na testa do bebê enquanto Clarice apertava a mão de Miguel, nervosa.
- Pronto, mãe... agora está tudo bem, tudo sobre controle ! - disse o médico pegando o menino.
E ele chorava. Em menor intensidade, mas chorava.
- Obrigada Doutor... muito obrigada ! - disse ela enquanto tomava o filho em seus braços.
Miguel fez um afago na cabeça dele e agradeceu ao médico também. Eles então foram novamente até o balcão e preencheram a bendita ficha. Ao terminarem, Clarice e Miguel se olharam, um sorriu para o outro. Ele colocou seu braço por cima do ombro dela e assim eles foram andando até o carro para voltarem para casa.

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